1 de setembro de 2003

DESDE QUE O MUNDO É MUNDO

DESDE QUE O MUNDO É MUNDO

Disse hoje ao vendedor do Carrefour:
- Por que vocês acreditam nessa técnica de vendas, que atordoa o cliente com som alto? Vocês acham que as pessoas, ao ficarem atordoadas, compram mais? Te garanto que é ao contrário: dá vontade de sair correndo daqui.
Resultado: cinco minutos depois, todas as televisões estavam desligadas e consegui fazer as compras em paz.

Disse à queima-roupa ao Antonio Abujamra, que apareceu de repente certa manhã em frente à sede da Fiesp:
- Por que você recita apenas os poetas consagrados? Te enviei o poema O País Perdido e você nem aceitou a provocação.
Abujamara foi saindo de fininho, argumentando que recebia e-mails demais. Hoje, domingo, ele criou um quadro para responder e-mails no seu Provocações, da TV Cultura. Claro que nada tem a ver uma coisa com outra.

Para o homem da banca de jornais e revistas:
- O sr. não tem troco para dez reais numa compra de quatro e quarenta?
Para a balconista da padaria:
- Não adiantou apontar para os pães mais torrados, você colocou todos os pães brancos dentro do saco.
Para a caixa da farmácia:
- Por que você está interrompendo seu atendimento para conversar com a colega?
Dois segundos depois ela quis me dar o troco novamente. Fui em cima:
- Eu poderia pegar seu troco de novo, já que você se distraiu.
Para a gerente do banco:
- Por que o telefone tem precedência sobre mim?Quem liga depois precisa esperar que você me atenda.
Para o açougueiro do supermercado:
- Pedi um quilo e você colocou um quilo e 150 gramas.
- Mas é só um bife a mais!
- Mas vai sobrar. Me venda o que eu pedi.
Para o dono do botequim da praia:
- A gente viaja mil quilômetros para chegar aqui e escutar o som do mar e não o seu som alto e de má qualidade.O silêncio é de ouro. Se o sr. trabalhar em silêncio, vai juntar gente. Tem poucas pessoas aqui porque o seu som é inconveniente.
Para dois balconistas:
- Desculpe interromper a conversa, mas você poderia me dizer onde encontro algodão e água boricada?

Passo o dia assim. Os vendedores estão estressados, indiferentes e mal pagos. Os clientes furam a fila e são mal educados. Minha catequese é despropositada. Preciso parar de ser consumidor. É sempre assim, “desde que o mundo é mundo”. Essa é talvez a pior expressão da terra. O mundo não era mundo e no momento em que se tornou mundo, tudo o que é porcaria surgiu. Pelo menos é o que entendo da frase. E como surgiu, ficou. Para sempre.
Minha abordagem inclui gerentes, vendedores, balconistas e empresários. Entrevistei um empresário de Piracicaba e ele me veio com essa:
- Esse pessoal veio do Nordeste e agora fundou um monte de favela na cidade.
- Mas quem chamou os nordestinos? perguntei. Não foram os empresários, que precisavam construir, ampliar a cidade e os negócios? E eles vieram, fizeram o serviço e deveriam voltar como foram? Pois ficaram, sem que ninguém fizesse plano nenhum para eles. Foram abandonados e agora viraram dor de cabeça. Culpa de vocês.

Eu sempre fui assim. Desde que mundo é mundo.

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