6 de abril de 2005

A DIALÉTICA EM JOÃO PAULO II (3)




Neste terceiro texto sobre o Papa, precisamos lembrar rapidamente o significado e o sentido de dialética, que, como explica Leandro Konder em O que é dialética (Brasiliense, 1986) é "o modo de compreendermos a realidade como essencialmente contraditória e em permanente transformação". O livro básico é A Ideologia Alemã, de Marx e Engels (Hucitec, 1986). A dialética veio de longe, dos gregos, de Zenon de Eléa e Sócrates, fundadores, que a definiam, segundo Konder, como arte do diálogo, ou a arte de, no diálogo, demonstrar uma tese por meio de uma argumentação capaz de definir e distinguir claramente os conceitos envolvidos na discussão. A dialética de origem marxista aportou na esquerda para engessar-se num fundamentalismo sem igual. Em compensação, o conceito filosófico de mais de dois mil anos, grego ou transformado pelo pensamento filosófico dos séculos 19 e 20, migrou para Igreja, que, como toda instituição humana (para os fiéis, de origem divina), não pode impedir que seja vista sob esta ótica. João Paulo II encarnou a dialética como ninguém.

CONFLITO - Francisco Antônio de Andrade Filho explica : "Para Heráclito de Éfeso, a realidade é um constante devir, tudo existe em constante mudança - que o conflito é o pai e o rei de todas as coisas - luta dos opostos: frio-calor, vida-morte, bem-mal, saúde-doença etc. Um se transformando no outro". Conflito é a palavra chave que define Woytila, o homem que soube assumir seu cargo de estadista e, por ter-se colocado no conflito de maneira surpreendentemente vitoriosa, nele atingiu a santidade. É bom que o pensamento progressista acolha urgentemente ao conceito de santidade em Woytila para que ele não fique confinado ao conservadorismo e à direita. Parece bobagem, mas não é (como assim, a esquerda reconhecer a santidade? perguntará o sabichão que reside em nós). Pois submetam-se, faz bem à saúde. Senão estaremos à mercê do marxismo de galinheiro de gente como Tariq Ali, tido como historiador, ensaista e romancista, que numa entrevista na Folha para a jornalista Sylvia Colombo disse que "movimento que ele promoveu nos rumos da Igreja Católica funciona como um espelho da atual situação mundial, refletindo exatamente o que aconteceu nos últimos anos na esfera político-econômica". A dialética não funciona assim, como se a Igreja espelhasse o Consenso de Washington. Isso é de uma pobreza mental sem limites. O Papa rompeu o bloqueio a Cuba, visitando Fidel Castro (que, como lembrou o Papa, estudou em colégio jesuíta), na mais bela transmissão (boicotada pela TV brasileira) audiovisual do nosso tempo. Foi contra a guerra do Iraque, pediu perdão pelos pecados da Igreja ( a condenação de Galileu, a Inquisição, entre outros), lançou pontes sólidas para todas as igrejas. Seu ecumenismo (bandeira maior do Concílio Vaticano II, de João 23) é antológico e profundo. Diz o idiota do Tariq: "Foi um papa autoritário que deixou abandonados religiosos que, no Terceiro Mundo, travavam uma luta pelos direitos humanos". Mandou o Leonardo Boff e o Ernesto Cardenal (que levou um pito em público) calarem a boca. A arrogância de certas pessoas, que se arvoram a gerar teologia por conta própria! Arrostem então a própria teologia, mas a Igreja nada tem a ver com isso. Aqui no Brasil, o Papa cobrou a reforma agrária e denunciou o assassinato das crianças.

MÍDIA - Há uma chuva de análises sobre o poder midiático do Papa. Queriam que o Papa saísse de aldeia em aldeia com seu cajado anunciando bulas por meio de papiros. A Rede Globo pode, o Papa não. Por favor, dêem licença. Woytila tinha noção da majestade do cargo e comportou-se à altura. Vejam a súcia de elementos que enviaremos para o seu funeral. A começar pelo Sancho Pança, o atual presidente da República, traidor do povo, que fez tudo ao contrário do que prometeu (viram o Enjôo Soares de mãozinhas dadas com o Palocci, o arrochador de plantão?); segue-se o Entregador da Soberania, o vendedor de estatais FHC (aquele que, depois de doar o país, com o povo dentro, para a pirataria internacional e nativa, posa de Abraham Lincoln); não contentes, enviaremos também o ex-presidente da Arena, o Consolidador da Ditadura, José Sarney (o cara que se elegeu pelo Amapá, sendo do Maranhão, graças a suas fotos ao lado do Papa); culminando com o Topete Arreganhado, Itamar Franco (que ganhou notoriedade internacional pulando carnaval ao lado de uma buceta exposta para as câmaras). Isso sim é que é poder contra-revolucionário midiático. Isso é o que produzimos aqui, o país que tem um governo que se impõe pela ausência do Estado e que por isso mesmo deixa o povo à mercê das chacinas. Pudéramos ter alguém como Karol (que significa Carlos) Woytila e sua dialética que desaguou na Santidade.

RETORNO - O toque nojento da cobertura é, como sempre, de Carlos Heitor Cony (o paga-pau da ditadura, que por décadas imperou na Manchete, território da direita, e agora ganhou mais de um milhão de reais por ter sido perseguido, quá quá quá, pela ditadura). Ele escreveu um monte de asneiras no seu espaço cativo na Folha sobre o poder midiático do Papa. Seu artigo foi intitulado "Um homem chamado Karol". Piadinha grotesca, fazendo trocadilho com Karol, como se fosse nome de mulher. Karol (Carlos) é como Sasha, nome de homem, mas aqui virou nome feminino. Nomes bonitos, do gênero masculino na origem estrangeira.

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