8 de novembro de 2005

A IMAGINAÇÃO APRISIONADA



O aprisionamento da imaginação é a tragédia maior do nosso tempo. Ela é fruto do engessamento da ascensão social (quando todos estão condenados) , que hoje só é possível, pelo menos em sua maior parte, por via lotérica (golpe ou sorte). O fogo que se alastra na França e já atinge a Alemanha é o sintoma desse círculo de ferro, que encarcera todo mundo e transforma a juventude em refém da violência e do terror. As drogas fazem parte do esquema: a grande demanda vem exatamente da falta de saídas oferecidas pela dita realidade. Drogar-se é a maneira de sair da prisão, mas isso significa exatamente o contrário, pois acaba consolidando a situação da pessoa que tentou escapar. Mas a droga maior é a mídia. Do colunista à primeira página, do noticiário à novela, do programa de auditório aos filmes escolhidos, tudo está voltado para o aprisionamento da imaginação, criado e mantido para subjugar a maioria em proveito de uma minoria que, esta sim, pode iludir-se de que pode sair do esquema e viver a grande vida prometida pela publicidade. Esta, avançou em direção ao conteúdo, erradicando os livros (suplementos culturais têm pouquíssimos anúncios e não existe, com raras exceções, progama culturais na TV). No lugar do livro, os comerciais os substituem inventando historinhas, com enredos e personagens-minuto, que tentam ocupar o grande vazio deixado pelo massacre da imaginação.

GLOBO - Se o aprisionamento da imaginação for encarado como um sistema, de camadas superpostas como uma cebola, ao tirarmos uma fatia teremos a Rede Globo. Vejam o noticiário: o apresentador pede a informação para o repórter que está no front. Este, fala para o apresentador, jamais para o telespectador. Eles conversam entre si, fechando o círculo. Quando um programa chama o outro, é o Galvão para o amigo Faustão e vice-versa. Somos, literalmente, espectadores. Os bastidores da nova novela obedecem a hierarquia: os atores menos votados vão para o programa da Angélica, os mais iimportantes para o Domingão. A novela das nove é o ápice do encarceramento. Trata-se de uma imposição, a convivência conflituosa de classes sociais, que nunca muda seu perfil. As defecções (a a ex-menina de rua que casa com o herdeiro) confirmam a imposição de uma sociedade dividida para sempre em classes sociais. O que é a cidadania na novela das nove? Empresários ou empresárias são vilãs, os homens são uns bananas na mãos das poderosas, as mulheres jovens são totalmente oferecidas (como o trio de bundudas em América e agora, no primeiro capítulo de Belíssima, a garota que se atira sobre o borracheiro). A fantasia sexual é a mais escrota possível: é baseada nas aparências, na brutalidade, nos interesses. Os milionários são apresentados como frios e calculistas e o povo como outra caricatura (para isso servem atores como Lima Duarte e Tony Ramos, horrendo na sua imitação de Anthony Quinn em Zorba, o Grego). O autor de Belíssima costuma chupar histórias, como fez com Matrimônio à italiana, de Vittorio de Sicca e neste primeiro capitulo, levado ao ar ontem, com Zorba. Tudo indica que o segundo está baseado no filme de sucesso, O Casamento Grego, recentemente apresentado pela Globo.

FINGIMENTO - Tony não é do ramo. Ele acha que atuar é fingir. Ele bate as mãos espalmadas, estende os braços e tenta ser grego e (cruzes!) dançar. Anthony Quinn não era dançarino, era ator. Se fosse preciso dançar, ele dançava como ninguém. Tony não sabe atuar, portanto imita de maneira tosca o que viu no cinema. Falaram horrores do Murilo Benício, mas eu discordo. Acho Murilo um ator de primeira. Ele sabe do que se trata. Sua extrema contenção como o cavaleiro trágico que enfrenta a morte (numa seqüência memorável, que salvou a novela da ruína) é um dos momentos maiores da televisão brasileira. Dizem que ele não movia uma linha do rosto. Não precisa! Foi o que disse Billy Wilder para Jack Lemmon, vindo do teatro e que estreava o primeiro papel no cinema: Você não quer que eu atue? gritou Lemmon. Exatamente, replicou Wilder, o gênio. Atuar não é fazer micagens nem gestos grandiosos. Charlton Heston é um exemplo. Sua gigantesca figuração de Moisés e Ben-Hur é pura implosão. Jamais esqueceremos sua grandeza em cena. Quando Marlon Brando abriu os braços em O Grande Motim era para tirar sarro dos canastrões. Marlon Brando tornou-se o maior ao não se mover, como comprova sua interpretação em Apocalipse Now. É um mistério. É a arte. É a imaginação solta de espíritos livres, coisa que não dispomos mais, com honrosas exceções. A invasão da Globo (atores, estética, dinheiro, tudo)no cinema é outro sintoma dessa tragédia. Tudo fica no Mesmo, quando deveríamos apostar no Outro, na Diferença.

RETORNO - Atenção Rosa Paes, da Secretaria de Cultura de Uruguaiana: enviei meu currículo, mas o e-mail volta. Publico então aqui:
Nei Duclós é autor de três livros de poesia:
-Outubro (1975), editado pelo Instituto Estadual do Livro do RS/ Editora A Nação, quando foi considerado por Mario Quintana um dos quatro melhores poetas do Rio Grande do Sul (ao lado de Armindo Trevisan, Carlos Nejar e Walmir Ayala). Outubro, obra considerada cult por Tabajara Ruas, traz alguns poemas que tinham sido expostos nas praças de Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro, quando fizeram parte de duas antologias pioneiras da poesia da minha geração: Tombam os primneiros homens nos trigais e Eu Digo (junto com outros escritores).
- No Meio da Rua (1979), editado pela L&PM, com prefácio de Mario Quintana
- No Mar, Veremos (2001), lançado pela Editora Globo, com prefácio de Mario Chamie, fundador da Poesia Praxis e um dos mais importantes poetas do Brasil.
É autor também de um romance:
- Universo baldio, editado pela Francis, de São Paulo, com apresentação do escritor paulista Raduan Nassar, considerado um dos maiores romancistas do país.
Tem quatro livros que serão publicados em 2006:
"Esperando John Wayne", romance, em co-autoria com Tabajara Ruas
"Diogo e Diana na Ilha das Bruxas", infanto-juvenil, em co-autoria com Tabajara Ruas
"Partimos de Manhã", poemas "As ruinas do discurso", ensaios literários, junto com "Todo filme é sobre cinema", ensaios sobre a Sétima Arte.
É formado em História pela USP (1998), tendo entrado para o doutorado (ainda incompleto), para defender a tese sobre o papel das Forças Armadas no período 1922-1935. Tem trabalhos publicados sobre o tema no site pessoal.
É jornalista profissional desde 1970. Foi repórter, redator, editor e resenhista
de inúmeros veículos de comunicação: Folha de S. Paulo (redator, cronista e crítico musical), IstoÉ (editor e resenhista), Veja (resenhista), Senhor (editor de Livros e Cultura), Bravo! (repórter cultural e ensaista), Estado de São Paulo (resenhista), Zero Hora (resenhista).
Atualmente é Editor Executivo de duas revistas: Empreendedor (mensal) e Empreendedor Rural; (semestral), de Florianópolis. É cronista e resenhista do Diário Catarinense.
Tem ensaios, poemas, crônicas e contos publicados em vários espaços virtuais importantes, como La Insignia, de Madrid, Cronopios, Bestiario e Maquina do Mundo.
Mantém um espaço diário na Internet, o Diário da Fonte(http://outubro.blogspot.com)
e o site http://www.consciencia.org/neiduclos
Sua obra foi resenhada por Fabricio Carpinejar, Luis Fischer, Sergio Caparelli e Tailor Diniz
Participou de várias antologias, como Há margem; Teia 2; a antologia organizada por Dilan Machado sobre poetas do Rio Grande do Sul; A Terra dos Longos Olhares, da editora Holoedro, organizada pela professora Lucia Silva e Silva.
Tem poemas musicados por Zé Gomes, Muts Weyrauch, Bebeto Alves e Raul Elwanger.

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