1 de janeiro de 2006

A ETERNIDADE EM CADA SEGUNDO





Descobrimos nesta virada do ano que desde os anos 70 os cientistas incluíram 22 segundos para compensar o freio que a Terra está dando no seu movimento. Graças ao segundo extra deste dia primeiro de 2006, vislumbramos algo fora do eixo das imposições dos senhores do tempo. A Terra faz o que quer e bem entende, não precisa obedecer os relógios atômicos. Mas se levarmos em consideração a quantidade de tempo incluído (ou surrupiado, sei lá), podemos prever uma insurreição completa do planeta, que decide subverter os cálculos da matemática e da física. Ela anda cada vez mais lentamente porque, imagino, resolveu dar uma guinada rumo a outra constelação; isso nos levará a novas e assustadoras regiões do universo. Ou então, ela vai freando, freando até parar por completo para fazer a viagem de volta; isso seria o que todo astro faz ao longo da eternidade, vamos lá saber?

PÊNDULO - Fico sempre de cara quando leio cientistas falarem com segurança o que aconteceu no tempo em que nem éramos ameba. Quem sabe o tempo não é uma ilusão, mas um pêndulo? A terra anda por um período em determinada direção, depois pára e volta. Seremos então como aquele personagem inesquecível de Dickens, filmado um trilhão de vezes (e que inspirou Carl Barks, da Disney, na criação do Tio Patinhas), o pão duro que na noite de Natal é levado pelos anjos da guarda para uma viagem pela sua vida. Ele vê então como foi egoísta, travado, ruim, cruel e malvado. Acorda arrependido e, dependendo do filme, distribui presentes para todos e ainda sai cantando junto à multidão que agora sim o adora. Um recado direto do capitalismo: ou você faz circular a grana ou morrerá seco como um arenque. Mas vamos falar da viagem de volta que faríamos, onde poderíamos, senão ver, mas sim voltar a sermos o que fomos, no ambiente que nos viu nascer e crescer. Brrrr. Não gostaria de voltar aos excêntricos 70 ou aos loucos 60, época de muita ditadura e solidão. E o pior: sem internet.

TORTO - Se o tempo não é uma ilusão, a Rede Globo é. Seu show de ilusionismo neste dia 31 inventou um consenso de festas em todo o país, o que é apenas mentira, já que, sabiam?, a chuva fez pifar os fogos em Floripa, enquanto a telinha exibia o sucesso do evento. A tratorista Ivete Sangalo (que marcha sobre a platéia com os sapatos da sua voz) é precedida pelo tal de Leonardo, que faz um sorrisinho torto cool enquanto canta a trágica canção imortal de Lupiscinio Rodrigues "(você sabe o que é ter um amor, meu senhor?"). O engraçadinho sorria enquanto a música falava em morte e dor. Ele fazia esse gesto execrável que virou moda, o de colocar a mão no ouvido para ordenar a massa a se manifestar (dentro dos limites propostos pelo palco, claro, já que a liberdade de expressão foi excluída). No fundo, a música cantada por Leonardo não expressa a composição de Lupi, mas se refere ao sucesso que a gravação fez na novela América. É um processo de deslocamento. O Brasil foi parando, parando e perdeu o rumo. Hoje transita pelas vagas estrelas da Ursa Maior, enquanto a Globo inventa outro país, se referindo a si mesma o tempo todo. Ontem eu ouvi uma repórter falar em verdadeira multidão, lugar comum enterrado em 1969 pelo Pasquim. Mas como o Pasquim foi desconstruído (a pata da ditadura acabou com o jornal), então fica por isso mesmo. Ainda nos debatemos com lugares comuns pré Pasquim.

BATISMO - Achei que 2006 seria o Ano da Mentira. É muito peso para um ano que está chegando. Acho que, como a terra, vou mudar de direção. Será o Ano da Imaginação, não é melhor? Prever é um jogo de dados, às vezes a gente acerta.

RETORNO - A imagem é mais uma obra de Fulvio Pennacchi, o artista imortal que o Diário da Fonte jamais cansará de divulgar.

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