29 de dezembro de 2006

O VERÃO POR ESTAS BANDAS





Vou trabalhar no solaço do meio dia. Fico na parada do ônibus, esperando o Amarelinho, oásis de ar condicionado sem escalas para o Centro. Um morador da ilha se aproxima e senta ao meu lado. A estrada onde estamos é o caos de tanto ônibus, caminhão, carros de luxo, ciclistas, motoqueiros e pedestres. O Barulho é tremendo. "É por isso que eu não gosto do verão", me diz o nativo. "Eu moro na praia, mas não posso chegar perto do mar. É gente demais. Para mim, o verão não deveria existir". Ao lado de uma blasfêmia dessas, bem temperado pelo banho matinal, de água limpa e fresca que me embalou por mais de uma hora, acabo pegando meu ônibus sem me despedir do interlocutor. Ainda há lugares, graças a Deus. Enfrentar o trânsito na estrada principal pendurado num verdão, que tem escalas e é sufocante, seria o pior.

Sento num dos bancos da frente e o único lugar vago que fica é depois preenchido por um turista furioso. Estou há mais de uma hora esperando esse troço. Governo de merda que não coloca ônibus aqui. Venho passar vinte dias e acabo ficando cinco porque nada funciona. E faz ameaças. Mas ninguém dá bola. Ninguém se mexe. Somos habitantes da ilha, moradores tranqüilos, acomodados nos nossos assentos. Estamos aqui há tempos. Cruzamos o inverno. Não nos despencamos pelo país à procura de um canto no litoral.

À noitinha, quando volto do trabalho, levo Maria Clara para seu passeio vespertino de verão. Olho para a multidão e umas duzentas pessoas estão lambendo cada uma o seu sorvete. Corpos vermelhos, roupas folgadas, corpo cheio de sal. Não existe delícia maior do que o verão. Temos litoral, não temos é planejamento, políticas públicas voltadas para o lazer de massa. As pessoas, trabalhadoras de todos os cantos, chegam para alguns dias sem stress, para descarregar a pele, a carne e os ossos de tanta violência e são recebidas assim, com engarrafamentos e tudo o mais.

Pelo menos aqui na ilha não é o caos. É um lugar civilizado, urbanizado, com sólida tradição, pessoas identificadas com o,lugar. Isso faz mais o charme de Florianópolis do que seus morros verdes e praias deslumbrantes. É uma cidade imensa, espalhada, com serviços de todos os tipos. Não comporta tanta gente, mas aqui você não fica abandonado num ermo, como acontece em tanto lugar. Mas deveria haver uma infra-estrutura à altura. Pelo menos nosso prefeito caprichou e a entrada do bairro de Ingleses está exibindo uma calçada fulgurante, maravilhosa.

Viva o verão e seus dias perfeitos. Viva o mar de energias e vibrações que a cidade recebe. Viva seus moradores e visitantes. Mas quanta coisa precisa ser feita! A estrada da qual falei é de fato uma avenida. Mas é uma estrada sem acostamento, cheio de postes atravancando o lugar dos pedestres. Muito complicado tudo isso. Precisaria uma intervenção estatal forte para mudar para melhor. Por enquanto, vamos levando, nesta véspera de ano Novo, esperando que Deus nos cumule de suas graças.

RETORNO - Foto de Daniel Duclós, tirada da Praia dos Ingleses de cima do morro das Aranhas.A imagem serviu de base para Juliana Duclós fazer a capa do meu livro "O Refúgio do Príncipe - Histórias Sopradas pelo Vento", que está vendendo bem. Tem livraria pedindo reposição de estoque.

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