10 de fevereiro de 2007

A LUTA E O LUTO

A democracia é o álibi perfeito para a ditadura. Os políticos não prestam? Foram vocês que escolheram! Não foi o jogo de cartas marcadas, a corrupção, a imposição do rodízio de quadros, sempre os mesmos, a manipulação da opinião pública, as legendas de aluguel, as traições, as falsas campanhas, nada disso. Foi você eleitor, trouxa, que votou neles e os caras são esses aí que vocês, e não a ditadura, escolheram.

O esquema então fica perfeito. Se continuar isso que chamam democracia, então a democracia se desmoraliza. Reabre as comportas para a “volta” da ditadura. Mas a ditadura continua, desde 64! Para que voltar, se ela está aí? O grande perigo seria mesmo a democracia, mas para isso deveria haver luta bem sucedida. E de luta todo mundo cansou. Hoje a moda é o luto.

A população clama por justiça. Quer acabar com a fábrica de facínoras, e com a política de segurança, que é idêntica ao cinto que prendeu o garoto arrastado por sete quilômetros no Rio: só serve para atrapalhar. Aí vem esses energúmenos com cadeira cativa na rede nacional de televisão para dizer que diminuir a maioridade penal não vai resolver nada. Crime hediondo não deveria ter limite de idade para a punição. Ninguém poderia ter o direito de matar pelo menos uma pessoa, como acontece na atual legislação. O cara tem dois metros de altura, um esporro de cinco metros de alcance, tem pé tamanho 46, umas manoplas que servem para carregar dez fuzis e é dimenor? A falta de lógica extrapolou todos os limites. No fundo a ditadura quer que o país se exploda. E é o que está acontecendo.

Quem disse que todos somos culpados pelo que aconteceu no Rio de Janeiro? Ele, Pablo Conejo, no seu blog na Globo (claro). Quem disse que não vai adiantar enquadrar o mandiocão assassino dimenor reduzindo a idade penal? Ele, o senador que vivia pontificando na época do Collor e depois de tantas denúncias virou coisa no Congresso. O trágico é que a pauta nacional é definida por quatro garotos da favela que resolvem roubar um carro. Vejam a fragilidade da nação entregue à sanha de todas as quadrilhas.

O acinte toma conta da primeira página. José Dirceu luta por anistia no país em luto. Tudo o que foi denunciado em 2006 está enterrado. A nação, pelo menos as gerações que estão vivas, sabem agora porque nós brasileiros somos tão escaldados, por que dizemos tanto não adianta. Não por sermos acomodados ou pacíficos, mas porque a violência é grande e profunda demais.

Quer dizer então que somos inocentes? Não há inocência quando atingimos a idade da razão. Mas é como diz a canção: nem virgem nem puta. Não é o povo que elege, é o sistema engendrado pela ditadura. Eles se perpetuam no poder, assumindo posições no front ou nos bastidores. São sempre os mesmos e seus clones. É armadilha fatal: estamos em plena ditadura exaustos da tal democracia; estamos em pleno luto exaustos da luta; estamos em plena indignação exaustos de tanta lucidez. Estamos de mãos amarradas. Presos ao cinto de insegurança que nos transforma em judas malhados pela crueldade.


RETORNO - Imagem de hoje: cena de "O encouraçado Potemkin", de Sergei Eisenstein.

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