14 de abril de 2009

FUTEBOLZINHO


Nei Duclós (*)

Escuto conversa na vizinhança sobre o pacato pai de família de 43 anos que foi “jogar um futebolzinho” e quanto voltou para casa, morreu. Leio a história do tritleta de 60 anos que gostava de dar uma arrancada final nas provas, muito aplaudida, e que, por motivos misteriosos, também morreu. Os esportes foram formatados na época em que havia corpo físico para suportá-los, quando a seleção natural da era pré-antibiótico colocava na arena aqueles caras que fizeram guerras e estraçalharam mundos.

Hoje, falta proteína na primeira infância mesmo para quem tem condições financeiras para isso, pois a indústria alimentícia se encarregou de eliminar qualquer resquício natural da sua linha de montagem. Vemos criaturas sem condições de agüentar o desgaste em campo ou nas pistas, mas como foi armado um gigantesco e milionário circo em volta disso, assistimos a um massacre. Não apenas entre os profissionais, mas principalmente entre os amadores, que são no fundo os excluídos desse falso Olimpo.

A televisão mostra preparadores físicos distribuindo plaquetas concentradas de suprimentos para jogadores que cada vez mais se parecem a palitos de fósforo. Não sei como conseguem perder três quilos por partida e continuarem vivos, pois, além disso, tem a quebradeira de caneladas e rasteiras. No final, ainda é preciso dizer “com certeza” depois da partida, quando não há fôlego nem para ficar em pé, mas deve-se honrar o compromisso e despejar alguma coisa nos microfones.

O único futebolzinho que existe é este na nação exaurida de seus recursos. Antes, levavam para o estrangeiro os adolescentes, agora escolhem crianças. Daqui a pouco vão carregar o futuro atleta na barriga da mãe. Assim garantem que o Brasil forneça o que mais falta fora daqui: talento. O problema é o que aconteceu com Kaká: quando chegou na Itália, tiveram que turbiná-lo, pois era um ser normal e não iria suportar a barra de jogar entre os brutos.

O futebol é uma representação do conflito, praticamente uma guerra. Mata quem joga e quem assiste. Tratá-lo pelo diminutivo só se houver pernas-de-pau em campo. É o que vemos nos campeonatos, para desespero das torcidas.

RETORNO - 1. Imagem desta edição: Futebol em Angola, foto de Antônio Azevedo.2. (*) Crônica publicada nesta terça-feira, dia 14 de abril de 2009, no caderno Variedades, do Diário Catarinense.

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