11 de agosto de 2009

MILAGRES


Nei Duclós(*)

Os milagres continuam na ativa, mas o ceticismo insiste em colocá-los na reserva. Motivos não faltam para explicar porque acontecem. A única sobrevivente de um desastre aéreo teve a seu favor a determinação de ficar agarrada num escombro do avião, que boiava. Não foi, claro, porque sua salvação tenha também sido obra das orações.

As jornalistas que foram salvas da morte certa graças à intervenção brilhante de um estadista americano devem agradecer à diplomacia, aos contatos, às conversações, e jamais ao brilho e à coragem, qualidades que fazem parte da vida espiritual. Ou ao apoio das divindades, erradicadas do jogo bruto entre nações armadas pelo irracionalismo da bomba definitiva.

Como a falta de lógica orienta as ações dos grandes poderes, é preciso que esse obscurantismo seja apresentado como única opção. O determinismo cria uma barreira contra a transcendência e a fé, pilares de uma percepção acima do muro que confina a cidadania. Os fatos que deslumbram a população por estarem fora desse pacote de acontecimentos previsíveis servem apenas de insumo para o noticiário das curiosidades. Eles não atingem o significado profundo de uma realidade fora da ordem mundial.

Somos testemunhas de inúmeros milagres. O emprego que chega no momento em que todas as portas pareciam se fechar, a volta do filho considerado perdido, a cura improvável que salva uma família são exemplos dessa sucessão de fatos inexplicáveis, atribuídos normalmente ao acaso.

O problema é que, com tanta escassez, nossos pedidos se limitam aos milagres prosaicos, que possam nos ajudar na sobrevivência. No fundo isso também é falta de fé, disseminada por todas as relações sociais, apesar de tanta reza e eventos lotados em estádios ruidosos. É costume esperar milagres como um casamento, uma herança, uma loteria. Jamais pedimos um jorro de luz na curva da estrada, quando somos derrubados pela evidência da intervenção do Criador, que nos fala diretamente.

Seria pedir demais? Acredito que não. No fundo, o que se espera de nós, almas eternas em passaportes físicos datados, é um pouco de lembrança da nossa essência. Mais do que o pão, que é apenas coadjuvante, necessitamos de inspiração, a graça suprema que paira sobre nós e fica a maior parte do tempo, invisível.

RETORNO - 1.(*) Crônica publicada nesta terça-feira, dia 11 de agosto de 2009, no caderno Variedades, do Diário Catarinense.

2. Imagem desta edição: Bill Clinton olha, emocionado, sua obra: a libertação das jornalistas americanas da Coreia do Norte, onde tinham sido condenadas à execução. Podem dizer o que quiserem, mas Bill Clinton é, talvez, o mais brilhante dos nossos contemporâneos (e ter seus defeitos apenas confirma que, dos simples mortais, pode surgir o gênio). Como é que ele convence um governo fechado e determinado daqueles a soltar as gurias? Milagre, só pode. Imaginem o Rumsfeld com o mesmo encargo. Seria recebido a rebencaço.

3. O único problema da foto é o gesto falso do Al Gore, o novo dono do "planeta" (que perdeu aquelas eleições por incompetência diante da fraude e pôs a culpa no Clinton). A emoção de Clinton é sincera, o sorriso confortador de Gore é fake. Muita ingenuidade minha tudo isso? Que me importa. Ainda acredito que as pessoas fazem a diferença.

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