4 de agosto de 2009

SUCATA NO AR


Nei Duclós

Tudo faz sentido. A sucata moral tem a ver com a sucata física. A segunda é fruto da primeira. O calhambeque que quase matou os passageiros numa zona de turbulência, no vôo entre Rio e Estados Unidos, carregava 168 pessoas amontoadas, que, por se tratar de gado, nem foram avisadas do perigo. Teve gente que furou o teto. Espalhou sangue por todo lado. Outra sucata, a que carregou a adolescente em coma num vôo entregando-a morta para os pais, faz parte de uma companhia irresponsável, que freta encomendas irresponsáveis de agências de viagem irresponsáveis. E por que um pai entrega uma filha, menina, nas mãos dessas gangs do turismo de massa para visitar aquela bomba que é a Disneylandia? Tudo é lixo, que sobra no ambiente político brasileiro.

Quer dizer então que Collor e Renan sabia que o Simon estava com o rabo preso numa maracutaia da carne podre de Chernobyl e só agora denunciam? Ou não era maracutaia ou era, então é crime o silêncio. Calheiros: “O senhor conhece a PortoSol, senador Pedro Simon? Conhece?” Silêncio no plenário. Simon baixa a cabeça. (Nota: A PortoSol é uma instituição comunitária de crédito que tem como presidente, desde 2006, Tiago Simon, filho do senador). Quer dizer então que o Collor está rosnando, mandando os outros engolirem as palavras? Daqui a pouco ele se candidata a presidente, com apoio do Lula. Esperem e verão. Teremos então Collor no Planalto, Dilma no Ministério da Defesa, Palocci no governo do Estado, Sarney como chanceler, Renan na Casa Civil e a bandidagem cobrando pedágio da população em todas as ruas.

Uma coisa é certa: quanto mais denunciam, quanto mais batem, mais ficam firme. Por que será? Porque estamos numa ditadura, não canso de repetir. Se fosse uma democracia, estavam todos presos. Como então se descobre as relações incestuosas do cacicão com elementos de judiciário e fica assim? Ou não fica assim, vai se arrastando, arrastando, até que de repente, podem apostar, Maluf vai ressurgir mais inocente do que nunca. A sucata é para nós: as viagens criminosas, as sessões políticas asquerosas, as figuras lombrosionas, as mentiras e os achaques. Para eles o luxo: castelos, viagens internacionais de primeira classe, foto com Obama, entre outras mumunhas.

E dá-lhe censura. Proibiram o Estadão de publicar denúncia sobre o filho do fundador da ditadura civil. Todos os dias tem um exemplo de censura à imprensa. Por que? Porque estamos numa ditadura, será possível que precise repetir? Todos os dias falam que isto ou aquilo não pode acontecer numa democracia. Por que será? Ora...Essa ilusão persistente, a de que nos livramos da tirania, é o mimo apodrecido que guardamos nesta vida falsa, que são os últimos 45 anos da política brasileira. Desde 1964 experimentamos o terror de viver à deriva, apartados do mundo civilizado, só que não nos damos conta. Primeiro foi a juventude, a bossa, o rock. Depois a “luta contra a ditadura”. Depois, a “democracia”. Nossa esperança foi loteada e vendida no mercado a futuro, que era sinistro.

Mientras tanto, eles permaneceram no poder e fazem gato e sapato do teu voto. A verdade é que não vencemos porra nenhuma. Fomos derrotados de cabo a rabo. E ainda levamos a culpa de eleger energúmenos, sabendo que tudo é carta marcada. Collor confessou ontem em plenário que sua candidatura em 89 nasceu num instituto de pesquisa. Claro, onde mais? Não temos “bases”, nem quadros, nem opinião pública. Temos militantes raivosos ameaçando por para quebrar a qualquer movimento de liberdade de imprensa, codinominada de golpista. Esses dias li que o Sarney lutou contra a ditadura. Que fenômeno. Por décadas apareceu na TV com o cabelo e a cara lambidos exercendo o cargo de presidente do partido da ditadura. Daqui a pouco vão dizer que o Médici, o Geisel, o Costa e Silva, todos lutaram contra a ditadura. Vai ver, quem sempre foi a favor da ditadura fomos nós, palhaços desse circo de horrores, fazendo rir uma platéia de monstros carregando um machado nas costas.

Essa talvez tenha sido a imagem mais assustadora que vi quando criança: no circo, um palhaço levou a machadada de outro palhaço e ficou de um lado para outro, curvado, com aquele troço nas costas. O que mais me dilacerava era que todo mundo ria!

Não temos democracia, mas temos blogs. Por enquanto.

RETORNO - Falando em blog, visitem o Blog do Virson : poesia, memória, crônica, tudo junto num espaço de primeira grandeza, de autoria deste aamigo escritor e jornalista, que finalmente dá as caras para todo mundo ver. Grande Virson Holderbaum.

Mais blogs: o do Noblat, sobre a crise do Senado, está ótimo. De quebra, um vídeo do baú: Lula batendo em Sarney em 1989, quando éramos mais trouxas.


Muito pesada esta edição? Leiam então minha crônica publicada hoje no caderno Varidades, do Diário Catarinense, Maná de estrelas (que vou postar mais tarde aqui, em edição especial).

Nenhum comentário:

Postar um comentário