16 de fevereiro de 2011

ESTILO


Nei Duclós (*)

Estilo é quando você acerta o texto de modo tão definitivo que todos duvidam da autoria. Isso lembra alguém, dizem, uma sumidade de onde foi tirado o tesouro. É evidente, comentam, que isso nunca te pertenceu, deve fazer parte de um capital simbólico mais consolidado e não medrar em território sem dono, no caso, você e seu talento perdido. Vários textos de qualidade correm pela rede e são atribuídos a celebridades, impedindo assim que se revelem novos autores. Estes, continuam no limbo, por mais que insistam e até mesmo quando o equívoco é denunciado pelo escritor beneficiado.

O problema é que a citação virou indústria. Há milhares de antologias e cursos fundados em insights consagrados, religiosos, corporativos ou políticos. É preciso concentrar riqueza em alguns e não dispersar o patrimônio em gente anônima. Não dá lucro citar alguém que não faz parte da nobreza. Se você escreveu bem, naturalmente o que está dito gruda no paradigma e o crédito justo voa. Assim, meia dúzia de nomes se destacam, enquanto amargam no anonimato todos aqueles que tentam vir a furo. Li recentemente a autocrítica de um editor que matou no ovo um romancista, que acabou desistindo e hoje se recolheu a um emprego medíocre. Ele poderia ter sido alguém, como diz Marlon Brando na cena clássica do filme “Sindicato dos Ladrões”, de Elia Kazan.

Não fosse Gustave Flaubert, teríamos seu pupilo Guy de Maupassant? Ambos geniais, foram lembrados num recente artigo de Claudia Lage do jornal Rascunho. Diz Flaubert para Maupassant: "O escritor não deve se impor ao texto, como um patrão aos seus empregados. É um trabalho de abnegação, sensibilidade e escuta. Mais vale ao autor a singularidade do que o estilo. Deve-se seguir o fluxo das palavras e das frases dos personagens. Em todas as coisas existe algo de inexplorado. É isto o que devemos procurar. Cada conto é uma criação específica. É como se cada palavra nunca tivesse sido usada antes. Faz parte de sua ilusão e sua beleza. A meta do escritor não é contar uma história, comover ou divertir,mas revelar o sentido oculto e profundo dos fatos. Na arte, não se busca o que é perfeito, mas o que é exato. O essencial em cada ação, o principal de cada fato”.

Flaubert é rei e nós, escribas de todos os calibres, seus abnegados súditos.


RETORNO - 1.(*) Crônica publicada dia 15/02/2011 no caderno Variedades, do Diário Catarinense. 2. Imagem desta edição: Gustave Flaubert.

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