4 de março de 2012

RESTO


Nei Duclós

E agora o que eu faço com o resto do tempo que sobrou depois que te perdi? Conto as gotas da chuva que caiu quando foste embora?

Te levei de contrabando para o mundo perfeito. Lá eras o exemplo, com tuas fantasias que encantam o espelho.

Caí daquele caminhão lotado de fugitivos. Pedi pouso em tua cabana mas tua familia expulsa peregrinos. Por isso fui morar na floresta, chapéuzinho.

Levaste um susto quando apareci montado em meu poema. Eu estava misturado às nuvens e temeste alguma chuva fora de hora. Mas era apenas o brilho do amor sem compromisso.

Ninguém me convence que esperas por mim. Imagino toda sorte de desperdício: reis que não te conquistam, deuses que preferem a fuga. Resta apenas eu, solitário escriba varredor da Lua.

Procurei nos arquivos e só achei meus erros. Mas tu descobriste a ficha onde registrei teu beijo.

Esqueci como és bela para aguentar o tranco. Basta olhar tua foto e pedir para morrer.

É dificil mobilizar tanta gente para compor um acaso. Melhor dizer que é de propósito. Problema deles se tirar pedaço.

Desta vez ninguém vai ceder. Nosso amor entregou-se à birra. Não te tiro para dançar nem que entoes nossa canção favorita.

Prometeste ligar para o número que não te dei. Estou esperando ao lado do aparelho que não tenho.


LUGAR

Não digo mais como vou. Respondo com evasivas. Cansei de ser o único deste grupo a fingir que estou vivo.

Falo de outro lugar, de outras pessoas. Nada a ver com este aqui, em que pedaços de granitos caem no meio da rua.

Fiquei desabitado depois de tua partida. Procuro a fonte do mel que nos envolveu de repente e depois sumiu.

Dei agora para mentir. É uma revelação. Só que não aguento cinco minutos. Acabo entregando que vim de Júpiter.

Me revisito para não me repetir. Já fiz isso antes.

As palavras fazem sentido quando alguém mora nelas.

Somos alguma coisa parecida com um anjo. Há um exercício de asas, um recreio de vozes, uma carga de raios.

As palavras são apenas a vanguarda do que somos capazes de fazer. Somos o despertar de uma estação ainda dividida entre o sono e a batalha.

Criei todo um sistema de ensino para ficar à altura da tua sabedoria. Mas não me querias próximo, apenas me pegar na saída.

Não queriam saber de mim. As perguntas eram um vício de quem prostituiu todas as respostas.


RETORNO - Imagem desta edição: Liz Taylor, para variar.

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