13 de abril de 2012

POESIA DO AMOR SINCERO


Nei Duclós

Poesia de amor parece fácil, mas ocupar uma porção do espaço superpopuloso de autores sem cair nas armadilhas comuns do gênero é complicado. Não se trata de evitar fórmulas, às vezes elas nem são importantes, pois podemos fazer um soneto sem o ranço passadista. Nem de tentar passar uma borracha em percepções ou manifestações clássicas do sentimento ou do relacionamento, pois um beijo sempre será um beijo, em qualquer época ou tom, mesmo que tome todas as formas imaginadas ou vividas. Ou de tentar ser original nesse espaço tão comum da humanidade. O que pega é, como sempre, a palavra.

Poeta pode usar caminhos consagrados, não ser original e assim mesmo ter sua voz própria. Pois é preciso que haja paz na diversidade autoral que é um fenômeno de massa da nossa época. É preciso abandonar as comparações espúrias, os rankings nefastos, as hierarquias estéreis e se abrir para a multiplicidade. Me baseio em duas citações de Mario Quintana, minhas favoritas: “estou na flor da minha idade” e “ser poeta não é dizer grandes coisas mas ter uma voz reconhecível entre muitas outras”. Voz reconhecível não significa obrigatoriamente originalidade. A poesia pode se confundir com tantas outras na abordagem dos assuntos, na contundência ou na sua falta, mas pode ser reconhecida como o timbre de uma voz num coro afinado em várias entonações.

Noélia Ribeiro se sai bem, com seu livro Atarantada (Verbis, 68 pgs.) na escolha que faz ao criar poemas de amor e de trabalhar o verso em favor do achado poético, mais do que o rigor escolar da poesia. Assim, fica livre para se soltar em insights como “você mudou da água para o vinho e eu num gole só me embriaguei de você”. E também para fulgurar em sínteses ótimas como “sofro da falta e do excesso de tudo” ou “dor que sói doer dói para valer”. A poeta se esparrama e se contém nessa combinação de batidas cardíacas, onde pontuam separações, um colchão lilás, perguntas, epifanias, celebrações. Ela se envolve com o que faz e se aproxima tanto que se confunde com seus objetos poéticos.

Essa transparência total, que sugere ser biográfica e está carregada de experiências e esperanças, faz de Atarantada um livro sincero, fruto do talento e da determinação da poeta. Noélia Ribeiro diz o que sente em versos que podem combinar ou não com as exigências de um leitor acostumado à poesia. Mas sempre será algo forte, próximo. Sabemos onde ela está situada e somos seduzidos por essa sinceridade que nos olha de frente, nem sempre com um sorriso, nem sempre com uma lágrima, mas com o fervor poético necessário que tantas vezes nos falta na vida que excede em desertos.


RETORNO - Imagem desta edição: Noélia Ribeiro.

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